Ida ao Teatro – “Farsa de Inês Pereira”
“Mais vale asno que me carregue do que cavalo que me derrube.” Foi este o mote com que a originalidade de Gil Vicente foi desafiada, dando origem à Farsa de Inês Pereira (1523), que os alunos do 10.º ano do Agrupamento de Escolas de Vilela viram, no passado dia 26 de fevereiro, numa representação realizada pela companhia de teatro O Sonho, no auditório de São Mamede, em Perafita (Matosinhos).
Esta peça contém, como tantas outras obras de Gil Vicente, uma visão marcadamente crítica da sociedade Quinhentista, mantendo uma atualidade desconcertante, tal como se percebe por este espetáculo com encenação de Rui Pessoa. Destaque-se a jovem casadoira e idealista, figura que entre os séculos XVI e XXI apenas sofreu alterações na aparência. Assim também sucede com o “príncipe encantado” (o Escudeiro), com a Mãe, com Pêro Marques, enfim, toda uma galeria de tipos sociais com correspondência na atualidade. Além disso, o tema do engano, inerente à farsa, e o cómico concorrem para o tom crítico e humorístico da caricatura de costumes. Assim, destaca-se a crítica à irreflexão da juventude que assume decisões vitais, por vezes de modo idealista e inconsequente, sem esquecer o poder oco das aparências, a denúncia da ignorância e, finalmente, a crítica aos três casamenteiros Leonor Vaz, Latão e Vidal, bem-humorada, mas impiedosa quanto à análise da hipocrisia e do motivo que determina a sua atividade: o dinheiro. A análise da sociedade não se esgota nestes temas, pois permite ainda um extenso debate sobre as relações sociais e sobre a violência doméstica.
Passam mais de 500 anos sobre a primeira representação da Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente, no convento de Tomar, ao rei D. João III. A peça foi escrita no auge da produção dramatúrgica do autor e tentava dar resposta às acusações de plágio de que ele vinha sendo acusado. Tudo isto testemunharam os alunos do nosso agrupamento, que destacam também o magnífico desempenho dos atores, que tiveram ainda a capacidade de interagir comicamente com o público e se disponibilizaram para conversar no final do espetáculo.